segunda-feira, 13 de agosto de 2012

MINHA HISTÓRIA, HISTORIADOR


Tudo que se passa no onde vivemos
é em nós que se passa.
Tudo que cessa no que vemos
é em nós que cessa.
Tudo que foi, se o vimos quando era,
é de nós que foi tirado quando partiu.
(Fernando Pessoa)

Minha História não começa com o desejo de estudar História ou de ser um professor de História. Apenas tinha o grande desejo de ser professor, mas sentia mais desafio na área de Exatas, e com o surgimento da Informática, minha trajetória tomou este caminho.
Fiz um curso técnico em Mecânica, iniciei um curso de Engenharia de Produção e depois, de Matemática e junto a isto, fui acompanhando o desenvolvimento dos computadores e seus programas. Era este o meu campo de trabalho e de busca por conhecimento.
A História começou a se insurgir lentamente em mim...
Lembro-me de assistir ao filme “Eles não usam Black Tie”, junto com meus amigos, em um cinema antigo que existia em minha cidade no interior de São Paulo. Sai do cinema inquieto. Aquela história era verdade? Aqueles fatos aconteciam neste país? Por que eu nunca havia prestado atenção nesta situação? Mas esta preocupação não ocupou muito espaço, acabou sendo arquivada.
Alguns anos depois, finalizando o meu curso técnico, consegui uma bolsa de estudos que me levou a viver três meses em Londres. Foi uma grande aventura. Eu, um caipira do interior de São Paulo, vivendo em uma grande metrópole como Londres. A casa onde morei era uma pensão por onde passavam pessoas das mais diferentes nacionalidades, vindas de diferentes lugares do mundo. E eu, jovem, pude ser por um tempo curto, amigo de todos: alemães, franceses, chineses, indianos, espanhóis.
Um dos lugares que mais me fascinou naquela cidade foi o Museu Britânico. Voltei a este museu inúmeras vezes. Caminhar por aqueles monumentos era como reviver no Egito Antigo, na Grécia, na Assíria. Tantos lugares, tantos tempos diferentes. E a própria cidade me falava de mundos diferentes, muito diferentes daquele mundo em que vivia. Mas, novamente, a História foi arquivada.
Voltando para minha cidade, senti que ela estava menor do que quando sai. No ano seguinte me mudei para Campinas, uma cidade maior, onde iniciei meu curso de Matemática.
Foi durante meu curso de Matemática que acabei ingressando no movimento estudantil. Houve uma greve, o centro acadêmico do curso de Matemática estava abandonado. Mobilizamos um grupo e reativamos o movimento estudantil naquele Instituto. Depois de Presidente do Centro Acadêmico acabei ocupando também a posição de Representante Discente no Conselho Universitário. Foi também o tempo em que comecei a trabalhar em um grupo de teatro. Universos se abrindo.
Foi neste momento que o meu papel de professor de Matemática começou a não me satisfazer. Havia algo diferente que me inquietava. Aquela inquietação do filme “Eles não usam Black Tie” tomou força. Como era possível, tudo aquilo acontecendo e eu, ali na praça, dando milho aos pombos...
Neste momento resolvi abandonar o curso de Matemática e tomar outros rumos.
Mas minha vida é um rio turbulento. Eu nunca tomo os atalhos, nem mesmo as estradas, que seguem uma linha reta se curvando apenas quando necessário, sempre nos convidando a seguir. Minha vida é um rio turbulento, que faz inúmeras curvas, sempre nos convidando a parar e redemoinhar.
Assim foi, viver em Belo Horizonte, viver em São Paulo, trabalhar em uma livraria importante, descobrir mundos, ai então, tentar o curso de História na USP, sem sucesso, ir para Ouro Preto, e então, finalmente, obter meu título de Bacharel e Licenciado em História.
Pronto, estava feito? Não. Estava apenas começando outra história.
Voltei a São Paulo e à livraria, adoeci e voltei para minha cidade, sempre pequena. Recuperei minhas forças e, somente muito depois, agora, a pouco tempo, assumi meu papel de Professor de História, da nossa História como humanos, demasiado humanos, querendo céu, e tropeçando nas pedras do caminho.
Apesar de professor tardio, minha experiência de vida me dá uma grande segurança naquilo que faço. Quando falo aos meus alunos não falo de uma História distante, falo da História que está em mim, que tem significado para mim, com todos os seus percalços, com todas as suas dúvidas, com todas as perguntas sem repostas ou com várias respostas contraditórias. Quando ensino História, não ensino uma História morta, definitiva, escrita em carrara; quando ensino História quero falar de todas as Histórias, até mesmo das Histórias impossíveis e principalmente das utópicas.
A História que procuro ensinar não traz respostas, apenas abre nossas Vidas, a minha e a de meus alunos, para mais perguntas.
Assim sou, professor de Histórias.


Um comentário:

Unknown disse...

Lindo e inspirador!