Em setembro devo apresentar uma comunicação oral sobre Clarice Lispector no VII Colóquio 'As Margens da Filosofia', em uma mesa conduzida pela Profª Marília Mello Pisani sobre mulheres na filosofia. O Colóquio é promovido pela Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo. Ainda aguardo a aceitação de meu trabalho, mas segue aqui um resumo para quem se interessar.
Seguindo a afirmação de Friedrich Nietzsche que nos diz que o filósofo está mais próximo do poeta, mas pretende ser um cientista, queremos aproximar um texto da escritora Clarice Lispector a um texto do filósofo Jean-Jacques Rousseau. O texto de Clarice A menor mulher do mundo apresenta inúmeras referências subjetivas ao Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens de Jean-Jacques Rousseau. Podemos começar com a personagem do explorador francês Marcel Prete que assume um papel cético, sem dogmatismo ou opinião; "sentindo necessidade imediata de ordem, e de dar nome ao que existe"; "pelo menos ocupou-se em tomar notas". Temos a descrição literária da tribo de pigmeus existente "nas profundezas da África Equatorial", "que, não fosse o sonso perigo da África, seria povo alastrado", "mesmo a linguagem que a criança aprende é breve e simples, apenas essencial" e "como avanço espiritual, têm um tambor", para os quais "não ser devorado é o objetivo secreto de toda uma vida" - muito próxima da descrição do homem selvagem do filósofo. Mais rico ainda é analisarmos os devaneios de senso comum, quando pessoas civilizadas tem contato com a descoberta da menor mulher do mundo através do "suplemento colorido dos jornais de domingo, onde coube em tamanho natural", como por exemplo; a mãe que "enrolando os cabelos em frente ao espelho do banheiro", "olhou para o filho esperto como se olhasse para um perigoso estranho" e "sabia que este seria um domingo em que teria de disfarçar de si mesma a ansiedade, o sonho, e milênios perdidos". Não podemos deixar de citar a análise sobre "um velho equívoco sobre a palavra amor", "que exige que seja de mim, de mim!, que se goste, e não de meu dinheiro. Mas na umidade da floresta não há desses refinamentos cruéis, e amor é não ser comido, amor é achar bonito uma bota, amor é gostar da cor rara de um homem que não é negro, amor é rir de amor a um anel que brilha". E no final do texto a escritora nos dá aquela resposta sempre aceita, arduamente questionada: "Deus sabe o que faz.".
O texto da escritora é curto, muito menor em número de palavras que o discurso do filósofo, e provocamos: será ele menos claro e distinto, menos significativo, menos verdadeiro? Onde não existe ciência, não existe verdade? Sem seguir qualquer norma ABNT, será ele menos valioso para o conhecimento do homem? Ser ou não ser não é a única questão.
(E eu, com minha subjetividade, penso que a superação da bestialidade no ser humano depende mais da arte que da ciência. Albert Einstein concordaria comigo.)
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