terça-feira, 21 de agosto de 2012

EXPERIÊNCIA CONCRETA DE PRÁTICA DE ENSINO DE HISTÓRIA
“Como posso jurar dizer a verdade? Só posso dizer o que sei.
Como posso saber se isto é a verdade?”
 (Índio Cree ao fazer juramento em um processo judicial sobre
uma barragem no seu território, Richardson, 1975).

Tenho várias histórias que me alegram no decorrer destes poucos anos como professor de história. Uma delas é sobre minha experiência na Fundação Casa em 2008. Eram quatro turmas de adolescentes em sistema de reclusão cursando o Ciclo II do Ensino Fundamental, baseado no Projeto ENCEEJA. A grande vitória foi obter, do líder de cada turma, a “permissão” para falar e ensinar. Neste ambiente, o professor precisa conquistar sua posição junto aos adolescentes. Neste ambiente, nenhuma autoridade é imposta. Eles estão naquela condição exatamente pelo fato de se colocarem concretamente contra todas as formas de autoridades e regras impostas em nossa sociedade. Assim, conseguir dar aula neste contexto, mesmo sendo aulas meramente expositivas, foi uma grande vitória.
Mas não vou me delongar nesta experiência, que acredito ser bastante diferente do dia-a-dia dos demais colegas neste curso. Vou descrever uma experiência que tive neste ano, com minhas três turmas do primeiro ano do Ciclo II, as antigas quintas séries, e que dialogam melhor com as Orientações Curriculares e os demais textos sugeridos para nossa leitura.
O primeiro ano do Ciclo II traz uma mudança bastante drástica para todos os alunos. Agora os alunos convivem com vários professores, cada um deles trabalhando com uma disciplina diferente. Cada professor tem uma relação e uma prática pedagógica diferente, além dos conteúdos. Por mais que se trabalhe em Projetos Pedagógicos e se proporcionem Encontros de Formação e diálogo entre a equipe pedagógica, cada professor tem o seu perfil e o seu “jeito” de ensinar. E os alunos tem que se adaptar a estas diferenças.
No caso da disciplina de História, seguindo o Planejamento realizado e o livro didático adotado pela Escola, iniciamos com os conceitos básicos de História: fontes históricas, mudanças e permanências na história, arqueologia, sujeitos da história, cultura e tempos históricos.
Para um estudante universitário, a leitura exaustiva de textos de historiadores reconhecidos são suficientes para propiciar uma aula com discussões e exposição de ideias sobre tais conceitos. Para crianças de 10 a 12 anos de idade, estes conceitos não tem nenhum significado, e a tarefa do professor é exatamente trazer estes conceitos “ideais” para o cotidiano dos alunos.
Assim, propus uma “brincadeira”. Em uma aula levei alguns objetos meus, que guardo há muito tempo, algumas fotos, objetos que ajudassem a identificação por parte deles. A partir dos meus objetos e de nossa conversa, solicitei que eles trouxessem, nas aulas seguintes, objetos que existissem em suas casas, fotos, álbuns, dinheiro, brinquedos. Propus que conversassem com seus pais e avós pedindo permissão para trazerem objetos também de seus familiares “mais velhos”. Na proposta deixei claro que os objetos deveriam ser trazidos dentro de caixas, e pedi para que não fossem mostrados antes da aula. Na medida do possível, eles gostaram da brincadeira e a maioria conseguiu manter o “segredo” combinado.
Nas aulas seguintes estavam todos excitados e animados com as surpresas.
Pedi para que as caixas fossem todas empilhadas na frente da sala. Depois, criei a história de um arqueólogo, lembrando os filmes de Indiana Jones. Feita a introdução, sorteei um dos alunos para ser meu “assistente”. Este aluno escolheu uma das caixas encontradas em nossa “exploração” e fez uma “análise” sobre o conteúdo da caixa.
A conversa e controle da aula, em alguns momentos, foi bastante difícil. Mas, para que a brincadeira pudesse continuar, todos acabavam colaborando. Depois de o assistente ter feito sua análise dos objetos encontrados, eu chamava o aluno proprietário dos objetos para “esclarecer” sobre o conteúdo dela. Neste momento surgiram várias histórias e conversas interessantes.
Esta atividade durou várias aulas, sem pressa, procurando proporcionar a participação de todos os alunos (apesar de serem mais de 35). E foi bacana que os objetos foram mudando no decorrer das aulas. Surgiram monóculos, fotos muito antigas, muitas notas de dinheiro antigas, até mesmo objetos bem diferentes e interessantes como máquinas fotográficas antigas e um gravador de fita cassete. Enfim, uma multiplicidade de objetos com muitas histórias e uma participação que despertou nos alunos a “curiosidade” e o “prazer” pelas aulas de história. Foi muito gostoso ouvir muitos alunos dizerem que a “aula de história é a mais legal”.
Bom, depois de toda a brincadeira, coloquei no quadro os conceitos de história que estávamos trabalhando. É extremamente importante neste momento deixar claro para os alunos a necessidade desta “formalização do conhecimento”. Mas, depois da introdução que fizemos, os conceitos tinham mais sentido, e consequentemente, significado. A atividade que eu chamo de “sensibilizadora” proporcionou as dúvidas necessárias para que a formalização do conteúdo fosse tão interessante e “legal” quanto a brincadeira.
Depois desta atividade propus aos alunos que, em grupo, eles criassem alguns cartazes com recortes de revistas e desenhos que mostrassem o que eles entendiam como “o que mudou na história do mundo”, e “o que não mudou na história do mundo”. Para mim foi importante, apesar de triste, que boa parte destes alunos reconheceram que a violência e as guerras é algo que nunca deixou de existir em nossa história.

Nenhum comentário: