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sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Carta para um amigo não tão distante

    Cá estou nesta longa viagem dias adentro.

    Eu, que sempre fui auto suficiente, me pego agora questionando minha solidão.

    Trouxe comigo vários livros para preencher meu tempo, me fazer companhia. Suíte Tóquio, A vida invisível de Eurídice Gusmão, Canção para ninar menino grande, estes já lidos, e agora Um beijo de colombina. Seleção maravilhosa da bibliotecária do SESC, faço questão de citar.

    Neste, do agora, a personagem encontra uma rosa como Manuel Bandeira, uma rosa branca, sozinha no mundo, sozinha no tempo, e tudo ao redor da rosa era excesso. A rosa da personagem estava no meio de um canteiro malcuidado de uma lanchonete de beira de estrada. A minha rosa é apenas… apenas? uma palavra entre tantas outras. Assim como eu, uma pessoa no meio de tantas outras.

    Esta rosa me fez parar a leitura. Esta rosa me fez parar e observar minha respiração. Esta rosa me fez conversar contigo, sem sua presença, o que é bastante comum. É muito bom quando isto acontece pois nestas conversas você apenas ouve o que eu quero dizer, não responde, não comenta. Às vezes eu ouço uma risada dentro da minha cabeça sem saber se a risada foi minha ou se foi sua, como agora.

    Escalar o Pico dos Itatins. Me deliciar nas diversas banheiras de hidromassagem nas corredeiras da cachoeira do Paraíso. A visita à Prainha e depois, uau, uma pausa semibreve ocupando todo o tempo do compasso, a trilha e a praia do Índio. Aqui sim, uma solidão absoluta. Uma praia toda minha. Todas as ondas para me banhar. Todas as sombras para me proteger. Entendi a origem do nome da praia, da pessoa que viveu ali por anos, sozinha, como o carvalho em Luisiana do Walt Whitman. Bem sei que eu não poderia. Mas por quase uma eternidade eu vivi, ali, só, pleno, sem vontade de sair.

    Essa contradição me interessa. No mesmo prazer da solitude, a sensação de falta, da ausência de companhia.

    Descobri como eu preenchia esta solidão no tempo passado, eu escrevia, escrevia muito.

    Nunca havia estabelecido essa relação até ler Um beijo de colombina. Agora eu percebo. Quando a solidão se faz presente a escrita me faz companhia, como agora, e as palavras preenchem a ausência.

terça-feira, 2 de abril de 2019

Leitura de I Ching com varetas

Durante muitos anos desenvolvi a prática de leitura do I Ching com varetas, estudando textos de C. G. Jung. A partir desta prática e dos estudos, preparei uma oficina de "Leitura do I Ching com varetas".

Projeto de HistóriaS

Obtive minha formação em História pela Universidade Federal de Ouro Preto em 2003 (Bacharelado e Licenciatura) e iniciei minha carreira como Professor na Rede Municipal de Ensino de São Paulo em 2010.
Neste período, desenvolvi diversos resumos e mapas mentais para auxiliar minhas aulas, nunca prontos, sempre em aprimoramento:














sexta-feira, 1 de julho de 2016

Erundina com @s LGBTs

No dia 17 de junho realizou-se um maravilhoso encontro da comunidade LGBT de São Paulo com a candidata a Prefeita Luzia Erundina (PSOL). Tive a honra de transcrever a fala desta Mulher Maravilhosa e tenho muito orgulho em poder compartilhar suas palavras aqui em meu blog. Conheçam a coerência, dignidade e visão desta Política rara em nosso país!



Eu quero agradecer a vocês o carinho, a receptividade, a confiança e essa energia enorme que vocês mobilizam. Eu quero agradecer também o que vocês representam de força de mudança na sociedade, não só na sociedade brasileira, mas no mundo todo, e a um custo altíssimo, haja vista a tragédia que ocorreu em Orlando. Esta é uma tragédia que se dá em todo lugar desse mundo e desse país todos os dias. Que se juntou naquele momento e houve aquela expressão coletiva de um massacre só pelo fato de as pessoas se amarem e colocarem o amor como uma coisa importante em suas vidas. E Isso me dá a consciência do quanto vocês representam nos dias de hoje não só para São Paulo, para o Brasil, mas para o mundo. Vocês estão rompendo uma cultura milenar que insiste em se preservar e se impor às relações humanas, às opções de vida, à existência e à realização da vida. Vocês não tem talvez consciência do que vocês representam potencialmente; da ruptura de um mundo que envelheceu. É o fim de um ciclo histórico-social. Tem uma lógica que constrói a história e que obedece a uma espiral dialética. Essa espiral dialética realiza ciclos históricos em tempos não precisos, mas em cada momento dessa história esse ciclo atinge seu ápice, ele retorna e não volta no marco zero onde ele começou, ele volta num outro nível e quando recomeça um outro ciclo este outro ciclo se constrói de forma potencializada, vai para um outro nível, superior àquele primeiro nível, e cada mudança de ciclo representa uma transição dolorosa, a transição de um ciclo transitando para um outro ciclo histórico-social. Isso é um imperativo da realidade, e a realidade é dinâmica, é dialética; seja a realidade pessoal, seja a realidade social, seja a realidade da natureza, seja a realidade da política, seja a realidade da cultura. Obedece a essa lei, a lei da dialética. E é uma dialética que se impõe nos processos sociais, nos processos humanos, em diferentes ciclos da história humana. E nós estamos vivendo isso, uma virada de ciclo. É um ciclo que já está no seu estertor, por isso que ele vem com tanta virulência, essa reação homofóbica, essa reação conservadora, fundamentalista, autoritária, repressora; reprimindo e comprometendo as conquistas que os grupos sociais conseguiram a duras penas. Eles estão muito inseguros. Eles estão com muito medo. Eles tem medo do novo. E vocês são o novo. Vocês estão rompendo com uma cultura.
Daí a importância e o peso político que vocês têm. Vocês não se dão conta disso. Vocês estão rompendo com aquilo que sustenta os alicerces de uma sociedade velha, antiga, esgotada; que é a ideologia, que é a cultura. É nisso que vocês estão mexendo, estão provocando, estão questionando, estão criticando, estão botando um outro caminho. Quem quiser enxergar que enxergue. Quem não quiser vai de roldão, porque é um determinismo histórico.
Eu estou dando essa fala inicial. Eu não estou querendo fazer discurso. Eu lamento não ter chegado mais cedo para ouvir todos os depoimentos que vocês fizeram aqui. É Exatamente o que a gente está provocando nos ciclos de conversa. Essa campanha está se dando exatamente neste modelo. Já fizemos dezenas de rodas de conversa. Estamos vindo de uma. Dos mais diversos grupos. Grupos plurais. E essa campanha, ela tem uma característica, e ela tem um significado, que é exatamente viver esse momento de um fim de um ciclo histórico-social, transitando para um outro ciclo histórico-social. Nós estamos num processo que está rearticulando as pessoas, está resgatando essas pessoas, está voltando a interessá-las pela política, pelo debate político. E tudo é política. E a solução dos problemas do mundo. A solução dos problemas, dos vários grupos sociais, como o de vocês, não é outro senão a política, como expressão de poder. E vocês são uma força política com enorme potencial.
Sobretudo porque vocês mexem na essência das vidas, das relações de uma sociedade. Vocês estão mexendo com a cultura, com valores, com conceitos. Vocês estão mostrando que esses valores, esses conceitos, esses preconceitos, essa exclusão que existe na sociedade, é algo velho, não cabe mais na evolução humana, em pleno século XXI. Então não se pensem na sociedade como um grupo que vai edificar uma política própria de saúde, ou uma política própria de educação, ou uma política própria de emprego. Vocês tem que lutar pelo espaço de vocês como uma força política que tem o que dizer para a sociedade no sentido da transformação desta sociedade. Essas coisas virão como consequência. Vocês tem que disputar o poder. Não só o poder institucional, mas o poder da fala, o poder de decidir as questões que lhes dizem respeito diretamente, o poder de serem respeitados e respeitadas, de serem reconhecidos, de serem ouvidos. É disto que se trata.
Eu não era candidata. Eu nunca pensei em ser candidata mais uma vez para a Prefeitura de São Paulo. Eu estava mudando de partido porque eu não aguentava mais aquela coisa horrorosa que era o partido que eu estava nele. Fui para o PSOL, que há muito tempo vinha insistindo nisso. Mas antes de ir para o PSOL nós já estávamos construindo uma outra via, que não é melhor nem pior do que as outras. É algo diferente. É algo que veio no bojo, nessa busca que existe no mundo de outras formas. Essas formas estão todas superadas. Seja a forma partido, seja a forma movimento sindical, seja a forma movimento popular, seja a forma que for. Forma não cabe mais numa realidade em transformação, em movimento. É revolucionário. Essa campanha, companheiras e companheiros, não está sendo uma campanha para disputar votos. É uma campanha que está servindo para reencantar a política. Para trazer de novo as pessoas a serem sujeitos da política. Se chegarmos lá isso vai se transformar em uma outra forma de exercer o poder na cidade. E não tenham dúvidas, nós vamos para as cabeças e vamos radicalizar a forma de governar essa cidade.
Quando o PSOL conseguiu me seduzir – e foi sedução mesmo – eu cheguei a dizer para o Ivan (Ivan Valente): – Oh, Ivan, ou você diminui esse assédio ou eu vou dedar você a tua mulher. Mas já são vários mandatos juntos, tem muita coisa, e ao mesmo tempo nós estávamos nessa busca de um outro caminho, de uma outra via, sem excluir as que existem e que tem identidade entre si, entre PSOL, RAIZ, PARTIDA e outros grupos que não tem nome, não tem título, não tem rótulo, mas vem nessa onda do novo, da descoberta, da criatividade, da busca de saídas. Não quero falar em crise. Eu não vim aqui para falar em crise. Eu vim aqui para falar do futuro. Este futuro. E este futuro está nas nossas mãos.
E vejam vocês, companheiras e companheiros. Vamos supor que se consiga derrotar a tese do impeachment no Senado. O que que virá depois? O que que virá a seguir? O mesmo governo anterior? Vai resolver? Não vai. Se perder e o impeachment for aprovado, esse governo já nasceu morto. É um natimorto. Portanto há um vazio no cenário político do país e do mundo que explica a emergência dessa força nova, dessa energia sem modelo, dessa força criativa, dessa irreverência que vocês representam; e quanto mais isso for forte e presente na sociedade mais rápido a gente rompe com esse velho dessa sociedade. É disso que se trata.
E aí eu vim para o PSOL. E ai vem a pressão para eu ser a candidata a prefeita. Minha gente, eu estou com oitenta anos, oitenta e um anos. Vocês acham que isso faz sentido? Eu já estava me preparando para encerrar – eu não gosto desse negócio de carreira não, carreira complica a vida política. Mas eu não ia deixar nunca de fazer política. Mas, evidentemente, eu ia deixar de ser candidata, da militância partidária. Eu queria passar para a Muna (Muna Zeyn) e para outros que estão se assumindo no institucional. Mas a gente não faz aquilo que é da vontade da gente, sobretudo quando a gente decide na vida da gente a fazer aquilo que o povo dita e quer que a gente faça. É isso que me convenceu, junto com meus companheiros da RAIZ, com meus companheiros do PSOL, numa plenária que eu convidei para prestar contas dos mandatos. Tinha mais de quatrocentas pessoas naquele plenário. E eles não queriam discutir “prestar conta” nenhuma. Eles queriam me pressionar pra eu ser candidata a prefeita.
E aí eu não escapei. E de lá pra cá essa pressão é cada vez mais forte. A ponto de me dar a compreensão de que há uma determinação. Não sei de onde vem. Mas vem do povo. É energia do povo. Dom Tomás Balduino era um bispo que trabalhava com os índios, que enfrentava o latifúndio, a repressão no campo. Ele dizia que o novo, o povo é quem cria. A gente não cria nada de novo. Quem cria o novo é o povo. Mas a gente tem que estar junto dele para que ele nos diga para onde ir. Então, se isso a gente acredita de fato, a gente não se perde, e a gente não recusa, e a gente não escolhe, e a gente vai junto, e as coisas não secam.
Então essa campanha está servindo para isso; trazer de volta quem havia se afastado, se desinteressado da política, os mais antigos, os mais velhos, os mais experientes, e ao mesmo tempo está havendo uma convergência, de um encontro, dessa energia nova da juventude. De todo lado vem movimento de jovens; sem nome, com nome, com projeto, sem projeto; mas é uma energia tão poderosa, tão forte, tão criativa, tão emergente, que eu acho que tem um fenômeno novo que está acontecendo nesse processo. Eu estou aberta a ele junto com vocês. Não quero discutir política de saúde, de educação, de trabalho com vocês. Essas políticas nós vamos construir juntos.
Quando eu penso em governar essa cidade pela segunda vez depois de mais de vinte anos. Eu não estou querendo repetir aquela experiência do passado, que hoje é reconhecida. Tem propostas que não se viabilizaram naquele momento, mas estão vindo pelas mãos dos movimentos, como o passe livre, que era uma proposta nossa e de Lúcio Gregori. Porque depois de mais de vinte anos essa cidade é outra cidade. Os problemas, muitos são os mesmos, mas agravados. Antes nós éramos 9 milhões e quinhentos mil habitantes. Hoje nós somos onze milhões e quinhentos mil habitantes, numa região metropolitana de vinte milhões de habitantes. E os problemas de São Paulo não começam e terminam em São Paulo. Começam e terminam, e não terminam, porque os problemas vão para além da região metropolitana. E numa segunda gestão nossa nós temos que pensar São Paulo não dentro dos seus contornos. A gente tem que pensar São Paulo na região metropolitana. Pensar São Paulo no Brasil. E outra coisa; ser prefeito ou prefeita desta cidade não é simplesmente administrar. É sobretudo fazer política, é liderar politicamente.
Não posso entender que a cidade que tem o terceiro orçamento do país, é maior do que o orçamento de todos os Estados, com exceção do Estado de São Paulo. Que essa cidade não tenha voz e influência nas decisões sobre política econômica desse país. E nós queremos, junto com o povo, organizado, politizado, e protagonizando um novo governo, impor os interesses, não só de São Paulo, da região metropolitana, do país inteiro. Nós temos que fazer a macropolítica. E a questão econômica está no foco. Ouvi o companheiro, ele colocava aqui com muita precisão, com muita oportunidade. Nós não queremos só administrar os recursos, embora sejam grandes. São mais de 50 bilhões, o orçamento da cidade. Mas vendo a dívida social e a demanda reprimida, isso não representa nada, sobretudo a questão da dívida, e o companheiro tem toda razão. Nós temos que começar a discutir a questão da dívida. Mas não é pra zerar a dívida. É bobagem zerar a dívida. O problema não é ter dívida. É que esta dívida não veio para a área de investimento, não veio para um crescimento, não veio para dinamizar a economia da cidade e do país. Não. É uma dívida que veio para reproduzir juros sobre juros e portanto, fortalecer o capital, reproduzir o capital, a concentração de capital. Nós temos que quebrar essa lógica. E uma cidade como São Paulo, com o peso político que tem, o peso econômico que tem, o peso social que tem, o peso científico que tem, o peso cultural que tem, é uma força política que tem que ser mobilizada. Mas não é um prefeito ou uma prefeita, ou um vereador ou uma vereadora, ou o poder institucional. É o poder popular.
E a governabilidade não passa pela Câmara Municipal. Nós não vamos ter maioria na Câmara Municipal. Vamos querer eleger o maior número de vereadoras e vereadores. Mas vamos governar da mesma forma como fizemos há vinte e sete anos atrás em que tínhamos minoria na Câmara. Para ter maioria na Câmara teria sido mais fácil. Mas eu teria que ter feito concessões éticas. E para fazer concessão ética a direita faz melhor. Porque a direita está no poder há mais de 500 anos.
A economia não pode se limitar só à macroeconomia. Esse modelo que está aí, no neoliberalismo, da política, em que há um superavit primário. O superavit primário, que é aquele excedente que não é excedente, porque se deixa de aplicar nas políticas públicas e se reserva quatro e meio por cento do PIB, quando não é mais, para pagar os juros da dívida. Em 2015 foram 505 bilhões de reais para pagar os juros da dívida pública. E os juros de uma dívida que se multiplica, porque não é uma dívida, é uma dívida especulativa, é um dinheiro que entra para especular. Os títulos públicos que o governo vende ao sistema bancário para manter o próprio Estado, numa roda viciosa, viciada, que não tem saída. A saída é política. É ter o povo com você, e a força do poder popular, e impor as regras, inclusive na negociação dessa dívida. Nós temos de renegociar essa dívida alongando o perfil dela, negociando os prazos de pagamento de parcelas. Isso sem sacrificar os direitos sociais básicos da nossa população. Isso só se faz com força, e força política. E auditoria! Isso está associado a uma luta pela solução do problema da dívida pública do país. A dívida do país já é mais de três trilhões. Com essa sangria, todo dia, toda hora, uma criança que está nascendo, ela está nascendo devendo uma certa quantidade de dólares. Isso não é justo. Isso não é razoável. E nós temos que enfrentar isso politicamente.
Então gente. Só vai valer a pena uma nova tarefa dessas. E ela já está se dando. Não pensem que só vamos começar a campanha quando chegar o período eleitoral. Até porque no período eleitoral nós não vamos ter tempo de televisão. Não vamos ter tempo de nada. Mas nós já nos antecipamos tanto na conversa política com o povo e os nossos compromissos com quem é possível, que queremos fazer juntos, que nós vamos levar de roldão, seja os candidatos que estejam aí, com tempo ou sem tempo. Se eles não nos derem o tempo para participar do debate com os outros candidatos nós vamos fazer o debate na porta da emissora que estiver fazendo debate. Nós vamos alugar um caminhão, com um som e o gogô para a gente conversar com o povo, na frente da televisão, enquanto eles estiverem disputando aqueles segundos para responder aquelas perguntas absurdas, fazer aquele teatrinho que é feito na televisão. Seria até bom mesmo que eles não deixassem a gente participar do debate que a gente produziria esse debate nas portas das emissoras, de todas elas, quantos debates eles tiverem que fazer. Eu não preciso de tempo de televisão, para a gente fazer chegar o recado ao povo e trazer esse povo junto para fazer valer esse recado.
Minha gente, meu povo. Eu estou muito animada.
Não se justifica, nós que somos socialistas. E a palavra é esta mesma. Não tenham medo da palavra nem das implicações desta palavra. Socialismo é o futuro da humanidade. É um modo de vida, é um modo de existir. É uma referência que dá significado e sentido à nossa existência. E nós vamos mostrar que é possível, para justificar que pessoas que tem uma vocação para o socialismo, que tem uma opção de vida pelo socialismo, que é possível, que vai fazer diferença. Para justificar inclusive o governo, uma esfera do poder do Estado. Nós não mudamos o Estado quando ganhamos uma Prefeitura. Nós não ganhamos o controle do Estado quando ganhamos o governo do Estado nem mesmo quando se disputa e ganha o governo federal.
Vejam o que aconteceu com os governos do PT. Cederam. Abrindo mão e capitulando o seu projeto original. Não jogo o PT como se joga a água, a criança e a bacia fora. Foi um grande momento da vida da juventude naquele tempo, e eu costumo dizer: eu não sai do PT, o PT que saiu de mim. Porque aqueles princípios, aqueles valores, ainda orientam a minha vida, ainda dão sentido à minha militância pública. Mas não posso concordar com o rumo que os governos do PT tomaram, fazendo concessões em claro e tentando governar só com uma base congressual de A a Z do espectro ideológico e de uma certa forma esvaziando a luta popular.
O movimento sindical foi domesticado no governo Lula. Não se tem mais oposição nem situação sindical. Eles já negociaram, através do imposto sindical, aqueles dez por cento do imposto sindical, que está sendo distribuído pelas centrais sindicais que se multiplicaram. Eram duas centrais sindicais. Hoje tem mais de dez centrais sindicais, pelos dez por cento do imposto sindical. Enquanto isso há um fosso entre a base sindical e a direção desses sindicatos através das centrais sindicais. Tanto é que eu tenho dúvida. Será que no extremo dessa crise o movimento sindical teria condições de chamar uma greve geral? Eu tenho minha dúvida. Porque não se faz luta, sobretudo luta a um nível de comprometer um determinado regime, fazer valer a vontade popular, com sindicatos que desapareceram das portas de fábrica, que não tem mais bandeira, nem sequer do ponto de vista econômico, muito menos do ponto de vista político.
Então meu povo, para justificar que a gente, com essa visão da política, e com essa visão de mundo, e com esse compromisso com a história que a gente tem, que faz muito sentido ir para um governo de uma cidade, quão importante, grande, potente que ela seja. Mas o caráter do Estado é o mesmo. Seja no município, seja no estado, seja na união. A única coisa que diferencia, e a única coisa que justifica, que a gente vá pra lá, disputar o poder e exercer o poder, se esse poder for dividido com a fonte do poder e a sociedade, são os setores populares. E a nossa proposta de gestão é radicalmente democrática. Nós vamos diminuir a cabeça do poder, diminuir o número de secretarias. Vamos empoderar as subprefeituras. Potencializando os conselheiros, os conselhos de representantes de cada subprefeitura. E vamos fazer o planejamento da cidade à base de cada região administrativa da cidade. E vamos planejar o orçamento de acordo com cada região da cidade. Nós vamos distribuir a gestão financeira no âmbito de cada subprefeitura. Portanto nós vamos empoderar o poder local. E o poder local são as subprefeituras através do conselho de representantes eleito diretamente. E que o subprefeito possa ser resultado da decisão que aquele coletivo de pessoas eleitas diretamente pela população, numa relação direta, permanente. E para isso nós temos hoje os meios, que são as redes sociais, que é a internet, que é essa tecnologia fantástica que nós não tínhamos naquele tempo. E isso nos dá uma enorme possibilidade de governar online. Todas as decisões, todos os controles, toda essa emoção de toda decisão, ser acompanhada dia a dia pela cidadania, pelos cidadãos, em cada recanto, em cada ponto dessa cidade.
E aí podemos, quem sabe, começar um novo tempo na cidade de São Paulo. E a partir dela, quem sabe, a gente possa começar um novo tempo no país. Eu acredito nisto. Isto é um imperativo histórico. Nós temos potencialidades para isto. Nós temos uma juventude incrível que está sedenta de participação, com uma capacidade criativa imensa, uma generosidade fantástica, e vocês sem dúvida nenhuma são parte principal dessa força e da energia que está revolucionando a cultura em nosso país. Não é pouca coisa. Vocês estão mexendo na essência, naquilo, como dizia Gramsci, que é a semente da sociedade, é o alicerce da sociedade, é a ideologia, são os valores, é a cultura, são as concepções, é o modo de ver o mundo, de ler a realidade. Vocês estão mexendo nisso. Por isso que vocês incomodam tanto. Por isso vocês são tão reprimidos. Vocês estão balançando as bases, estão mexendo nas bases, nos alicerces, nas colunas que sustentam esse estado velho, carcomido, fundamentalista, impotente, incapaz. E o novo não se sustenta num vasilhame velho, não se sustenta com um vinho novo, borbulhando dentro dele, com a energia que tem um vinho novo. Vocês são esse vinho novo. E esse estado brasileiro, em todas as suas expressões, seja município, seja estado, seja união, é uma vasilha velha, onde se põe vinho, que não sustenta mais a vitalidade do vinho, que é essa juventude, essa energia nova, que está vindo, que está rompendo com as barreiras, com os obstáculos, e colocando o novo que está nascendo. Vocês são parteiros de um novo tempo, parteiras de um novo tempo. Isso não é pouca coisa.
Quando essa experiência for histórica, os historiadores verão o que isto significou. É preciso que a gente tenha consciência disso para a gente inclusive ser capaz de resistir aos ataques, às pressões, às violências, ao morticínio que existe contra vocês e contra os pobres dessa cidade, desse país. Na cidade mais rica do mundo a população de rua está morrendo de frio nas calçadas da cidade. É como diz uma jornalista que escreveu um artigo sobre aquelas minhas perguntas ao prefeito. Muitos dizem que não gostaram. Paciência. Eu não quero dizer nada para fazer ninguém gostar. Eu quero fazer aquilo que a minha consciência me diz. E aquela jornalista dizia o seguinte: a cegueira política mata mais do que o frio. E mostrava o quanto aquelas reações ou aquele silêncio inicial em relação a essa situação trágica, tratar seres humanos como objeto. A guarda civil metropolitana tirando os colchões, e tirando os papelões, que dava condições para se protegerem do frio de três graus e meio, como ocorreu dias atrás, dia esse em que morreram cinco, entre um dia e outro morreram cinco moradores de rua. Não gostaram que eu tivesse falado aquilo. Era melhor o silêncio para eles. Estão alegando que eu estou dividindo a esquerda. Que esquerda? Eu não estou falando isso porque eu sou candidata. Eu não estou falando essas coisas porque eu sou candidata. Eu estou falando essas coisas porque eu sou uma cidadã. E mais, eu sou uma cidadã que tem um mandato popular. Eu tenho a responsabilidade de não ser omissa, de dizer as coisas tal qual elas se colocam. Não faço as coisas para agradar ninguém, sobretudo se a minha consciência está me dizendo o que eu devo dizer. Pagar o preço que for.
Então meus companheiros e minhas companheiras. Desculpem que é um certo desabafo também. A gente, para fazer as coisas, têm que fazê-la com alegria, sendo felizes, tendo paixão, tendo tesão. É isso que nós precisamos ter nesse momento. Ter paixão por essa luta, ter paixão por esse momento que estamos vivendo, e que a história nos confia e nos delega como cidadãos. E fazendo dessa cidade uma cidade e um espaço para todos. A própria palavra cidade nos reporta ao termo cidadão, cidadania. Uma cidade tem que ser uma cidade para todos os cidadãos dessa cidade, e portanto toda as suas energias, todo o seu potencial, todas as suas ações, todas as suas políticas, tem que ter o crivo da sociedade organizada que tem que realmente atender de forma, o máximo possível e necessário, ao direito de cidadania de todos os que vivem, moram e constroem essa extraordinária e generosa cidade. Nenhuma outra cidade, nem Uiraúna, onde eu nasci, teria me eleito prefeita como me elegeu naquele tempo. Sofri muito preconceito também. Eu recebia carta com fezes dentro, durante muito tempo enquanto eu estava como prefeita. Mas isso não me intimidou, nem isso me tornou vítima. Não. Eu fiquei com pena de quem vai no banheiro, pega o seu papel, faz cocô e põe um pedaço de cocô lá dentro e ainda põe no correio. Naquele tempo era o correio. A carta era no correio. Era mais infeliz do que eu, se eventualmente. Entendeu? Então. Eu não paro no negativo. Eu faço do povo de São Paulo, cuja metade é de nordestino, que me elegeu prefeita pela primeira vez. E agora, muito mais do que só os nordestinos, muito mais gente numa cidade que é pluricultural, a cidade dos mil povos, quem sabe, vai nos levar de novo para lá, e ajudar a levar o povo para o poder, nessa cidade, e para usar, e para exercer e para transformar esse poder na força real do povo construindo o seu destino em São Paulo, e a partir dela, em todo o país.
Obrigada a todos vocês.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

MEMÓRIAS NATALÍCIAS

A cidade ainda estava adormecida quando eu comecei a caminhar por suas ruas e memórias. Eu penso como se escrevesse e, ao caminhar, o pensamento fala alto.
O Lago Municipal é um dos lugares que eu mais gosto de visitar quando estes momentos ocorrem em minha cidade natal. Muitas vezes em minha vida, em noites de insônia e de pensamentos que não cabem em minha cabeça, caminhar ao redor do lago sempre me traz tranquilidade.
No I Ching, Tui é o trigrama do lago, representa a filha menor, mais jovem, e seu atributo é a alegria. No entanto, essa jovialidade e alegria não se origina na maleabilidade de que é dotada a linha na última posição. O atributo do princípio maleável ou obscuro não é a alegria e sim a melancolia. Todavia, a alegria é indicada pelo fato de haver duas linhas fortes no interior que se expressam no plano externo através da suavidade.
Nesta manhã de natal, enquanto a cidade ainda estava adormecida, para lá fui eu, levar meus pensamentos para passear e para intensificar minha alegria este passeio foi um lindo presente.
Desde minha infância o lago foi meu lugar. Me lembro de olhar a placa do parque de brinquedos e calcular quantos anos eu ainda poderia usufruir daqueles brinquedos para crianças até 12 anos. Me lembro de desobedecer mãe e avós e ir até o lago sozinho apesar da advertência de nunca ir ao lago sem alguém para me acompanhar. Me lembro de caminhar no zoológico, pelo corredor ladeado por jaulas com animais. Do urso que não parava de andar desesperadamente dentro de sua jaula com piscina, pela qual ele entrava e saia como parte de seu trajeto quadrilátero. Do macaco que jogava banana e cocô nas pessoas que ficavam gritando com ele para depois desviar das bananas e fezes jogadas. Do leão desdentado que fugiu da jaula e foi morto antes mesmo de sair da área do lago.
Este zoológico foi fechado pelo IBAMA há muitos anos atrás. Muitas pessoas ficaram aborrecidas por tirarem delas este direito à diversão. Eu parei para pensar e fiquei agradecido, apesar de não saber para onde urso, macacos, leões e os outros animais foram levados e que espécie de jaula eles passariam a habitar.
Por todos estes muitos anos desde que o zoológico foi fechado, esta área do lago ficou abandonada, com suas jaulas vazias, com seu corredor intransitável. Hoje, para minha alegria e presente de natal, esta área do lago foi revitalizada!
 















Onde antes havia jaulas, hoje existe pequenas praças com bancos de madeira, muita água, plantas, flores, ervas, um lago com carpas e uma gaiola imensa com inúmeras araras. O parque de brinquedos também foi revitalizado, com brinquedos novos. Já vivi muitos anos além daqueles que me restavam para brincar nos brinquedos do parque, mas senti minha alma revitalizada.
 



















Para maior alegria, foi criado o Projeto Pró-Arara. Há algum tempo eu vinha ironizando o nome de minha cidade natal, que não devia mais ser chamada de Araras e sim de periquitos, pois não havia mais nenhuma arara na cidade. O Projeto Pró-Arara é um centro de reabilitação de aves nativas vítimas de maus tratos ou apreendidas do tráfico ilegal para reintrodução à vida livre na natureza de Araras. Presente melhor não há!
 














Minha imensa gratidão ao Prefeito Brambilla e a todas as pessoas responsáveis e envolvidas nesta transformação maravilhosa.

Depois de me encantar com este presente delicioso voltei para minha casa. O caminho de volta foi uma imersão em recordações. O Cine Araruna é uma igreja com catarses espirituais da idade média. O Cine Santa Helena está abandonado e sujo. A Basília de Nossa Senhora do Patrocínio com o som de orações e sinos se espalhando pela praça. O banco de madeira antigo, um dos últimos que restou de tempos imemoriais, onde meu avô Nicolau se sentava protegido pela sombra de uma árvore que foi cortada.
Continuando a caminhada, o parque infantil onde aprendi minhas primeiras letras. Logo depois, a casa da minha avô Sunta, que hoje é um escritório. Sempre passo em frente a esta casa e respiro forte para tentar sentir os cheiros daquela casa, o cheiro gostoso de velha da minha avó, que eu sempre sentia quando a abraçava. O cheiro do fogão a lenha. O cheiro da sala e dos quartos. Aquela casa era repleta de cheiros que hoje não existe mais.
Pelo caminho, muitas casas estão vazias, com placas de vende-se ou aluga-se. A ausência e abandono são perceptíveis. Minha mãe estava me contando dos falecimentos. As pessoas que habitavam aquelas casas não vivem mais. Será que a memória viverá? Ou a memória já foi vendida, alugada ou simplesmente encaixotada?

Feliz natal para todos, até que a morte nos separe.

sábado, 30 de novembro de 2013

Um dia qualquer na vida de um Professor...

Revoluções, aula prática, preparativos, 6as séries!!!


Revoluções, aula prática, prontos para invadir as ruas!!!


Revoluções, aula prática, cartazes, bexigas e alegrias nas mãos!!!


Revoluções, aula prática, em frente, marchemos!!!


Revoluções, aula prática, o convite!

Revoluções, aula prática, a comunidade alegre raiando o dia!


Revoluções, aula prática, tomando a Praça!


Revoluções, aula prática, a Praça é nossa!!!


Revoluções, aula prática, preparando para soltar as bexigas... 3... 2... 1...


Revoluções, aula prática...


Revoluções, aula prática, voltando para a Escola! A Felicidade de um trabalho feito com Amor.


Revoluções, aula prática, a última curva do rio, e nossa Escola...


Revoluções, aula prática... enfim... o fim (?) ...


Revoluções, aula prática, os professores parando o trânsito!


Revoluções, aula prática, o momento mais difícil de conter as lágrimas, o maior símbolo de nosso trabalho: o abraço das Amigas!!!!


segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Um linfoma chamado Hodgkin - VII

Supiro!
Estamos em outubro, quase final de ano. No mês passado completei 49 anos e já digo que estou com 50. Já posso arredondar, prefiro assim. Meio século. Tem um significado intenso, principalmente depois de passar pelo processo deste linfoma chamado Hodgkin.
Preciso agradecer a tantas Pessoas... preciso agradecer tantas Pessoas que eu conheço e que estiveram bem próximas a mim nestes momentos, e preciso agradecer a tantas Pessoas que nem mesmo me conheciam ou me conhecem ou virão e me conhecer e que foram essenciais para a minha vitória.
Esta foi uma das lições que aprendi e que preciso compartilhar: EU NÃO ESTOU SOZINHO! Apesar de ser uma luta pessoal, individual, eu nunca estive sozinho, em nenhum momento. É a guerra, é a batalha, onde o soldado luta sozinho, mas a vitória é algo que está além do indivíduo, a vitória não é do "herói".
Eu aprendi a ver "DEUS", a encontrar "DEUS" de diversas formas. "DEUS" adquiriu um poder e uma abrangência muito maior do que aquilo que reza qualquer religião. Tanto as práticas orientais quanto as africanas enfatizam este "DEUS" que está dentro de nós. Mesmo as religiões judaico/cristãs/muçulmanas, que tem a mesma origem, e que não abandonam suas violências fraternas, mesmo estas religiões tão violentas, sempre dizem, sem praticar, que "todos somos filhos de Deus"... Pois então. Aprendi esta lição.
Uma vez afirmei, para um amigo "crente", que não acreditava na existência de Deus. Ele riu e me respondeu que Deus não precisava que eu acreditasse nele.
Se existe Deus, ele não precisa da minha fé... sou eu que preciso ter fé em Deus... E eu tenho. Eu tenho fé neste Deus presente em toda a história da humanidade, em todas as regiões deste mundo, que se molda para cada povo, para cada lugar, para cada pessoa.
Muitos dirão que estou errado, outros dirão que isto é blasfêmia, vários vão me colocar na fogueira de suas vaidades. Se isto acontecer, eu vou queimar, e minhas cinzas ainda terão, em si, esta essência do Deus que eu conheci.
Cada elemento químico que atuou em meu corpo, provocando enjoos, deixando marcas, para derrotar meu câncer, cada pessoa que participou direta e indiretamente desta longa história que está além da minha história individual. A este Deus presente em cada átomo que se anima, que se move. Agradeço e Vivo!!

Um linfoma chamado Hodgkin - VI


Demorei para postar as mensagens finais... 2013 está sendo um ano bem "rápido", como se o tempo segui-se com uma velocidade maior do que a velocidade de minha vida.
Janeiro e fevereiro foram os meses dos ciclos finais da quimioterapia, e como nos anteriores, segui firme. Os enjoos estavam mais fortes e as veias mais sensíveis. O corpo realmente demonstrou seus limites e o lado "agressivo" do tratamento ficou evidente. Como diz o ditado: dos males, o menor. Nesta etapa já não levei mais meus amigos queridos para me acompanhar. Não achei mais necessário. Apesar da dificuldade, já havia aprendido a lidar com ela e, como é de meu feitio, prefiro enfrentar estas lutas "sozinho"; sozinho entre aspas, pois nunca estive só. Família, amigos, toda a equipe médica, enfermeiras, atendentes, pesquisadores, anjos e mestres espirituais... Esta foi uma grande lição pragmática: a união faz a força!
Março e abril foram os meses da radioterapia. Aqui, um longo parágrafo. Apesar de ser um tratamento mais rápido, senti muito mais os efeitos. São apenas alguns segundos na mesa, mas são horas na sala de espera. São centenas de pessoas passando pelo mesmo processo, que se encontram em um mesmo lugar. É uma experiência muito forte e difícil de ser descrita. Olhar para as pessoas e, com o passar dos dias, conhecer algumas histórias, acompanhar poucas destas histórias, conhecer finais felizes, conhecer finais não tão felizes. Foram dias bastante difíceis, tanto pelo aspecto físico quanto pelo aspecto humano. Aprendi a respeitar muito este "ser" semelhante a Deus. O aspecto das religiões que enfatizam o "DEUS" que existe dentro de cada Pessoa! Mas como já escrevi, é uma experiência difícil de ser descrita, portanto, vou me deter no seu aspecto técnico.
Há todo um processo de preparação, e depois a rotina da espera e do "banho de radiação" - inventei esta expressão agora. O que me encantou foi a tecnologia. Todo o maquinário e as técnicas necessárias que foram desenvolvidas para que este tratamento tivesse seus efeitos e resultados. Durante esta etapa estava finalizando a leitura da biografia de Jean Genet e descobri que este autor que tanto admiro também teve câncer e passou por um tratamento de radioterapia. Obviamente, quando Genet passou por este processo esta tecnologia estava em seus primeiros passos, e o resultado não foi tão positivo. Mas foi bom conhecer sua história e um pouco da história da radioterapia. Gostava de brincar com os enfermeiros comparando aquela máquina enorme a um "transformer"; aqueles robôs que se transformam em carros ou outras máquinas. Brincava com os enfermeiros dizendo que, no final do dia, aquela máquina monstruosa se transformava no carro para que eles voltassem para casa. Era um momento de riso e diversão, que sempre estava presente entre a equipe de enfermagem. Acho que este "bom humor" era essencial para a própria sobrevivência da equipe, em um ambiente tão denso. Em um dia de chuva, o enfermeiro me respondeu que aquela máquina se transformaria em um barco. É muito bom rir nestas horas.
No meu caso foram apenas 20 sessões de radioterapia. Mas este tratamento agride bastante o corpo. São sessões diárias. Não temos pausa para uma "recuperação". É um tratamento mais intenso e direto. As marcas do bombardeamento radioativo aparecem. A pele fica vermelha, os cabelos caem. Como o meu tratamento foi no pescoço, minha garganta ficou irritada, sensível, provocando dificuldade para comer e até mesmo beber. E novamente, o cuidado consigo mesmo é essencial. Apesar do incômodo, em nenhum momento deixei de comer e beber. É preciso fortalecer o corpo, não se pode abandoná-lo à própria sorte. É uma luta interna, nosso ser e consciência com nosso corpo. Os amigos e a família pode ajudar sim, mas é uma luta muito interna. É o nosso corpo que está precisando de cuidado, e apenas nós mesmos temos a capacidade e sensibilidade para cuidar dele. A conversa rápida com os enfermeiros foi de grande ajuda. Expressar as dificuldades, ouvir e acatar os conselhos. Gargarejos, cremes... enfim, muitos cuidados. Não podemos ignorar nada, mesmo os pequenos detalhes.
Nesta etapa eu contava os dias, eu contava as horas que faltavam. Mesmo depois de finalizadas as sessões, os efeitos continuaram... e foi mais de uma semana até o corpo voltar ao seu estado anterior. É uma luta que exige dedicação e força.
Em uma das sessões, pedi para que o enfermeiro tirasse as fotos que estão aqui neste artigo. Ele não queria, argumentou que não era permitido... mas com meus argumentos eu consegui fazê-lo ceder. - Para que você quer uma foto disto? - Para me lembrar? - Se lembrar disto? - Sim! Me lembrar da minha luta e da minha vitória!
Estas fotos são o meu troféu!

domingo, 22 de setembro de 2013

OS GIGANTES DA MONTANHA do GRUPO GALPÃO!!


Eu sei que não vou conseguir escrever tudo o que pretendo.
Eu sei que não vou conseguir descrever minha emoção, minhas sensações, minhas percepções, meu prazer, meu êxtase. Mas preciso tentar.
Como Genet, sobre a desgraça em Chatila,  "O sentimento no ar, a cor do céu, da terra, das árvores, isto pode ser descrito"; mas nunca a força dos gestos sobre o palco, o brilho dos olhos, a franqueza nas interpretações e a magia que emana no magnífíco espetáculo "Os Gigantes da Montanha".
Preciso revisitar o primeiro trabalho que assisti de Gabriel Villela, "O Concílio do Amor".
Estava em cartaz em São Paulo com um espetáculo infantil e saia do teatro correndo para chegar no CCSP, enfrentar a fila para comprar o ingresso, e viver, por 3 semanas seguidas, aquele encantamento.
Cada gesto, cada olhar, cada detalhe. Era tanto, era tão intenso, que aqueles momentos permanecem em mim apesar de já se passarem mais de 20 anos de vida... Era tanto, era tão intenso, que não parava de falar sobre o espetáculo e, chato que sou, acabei levando todo o elenco que trabalhava comigo para compartilhar aquela experiência.
É assim com "Os Gigantes da Montanha". Uma única vez não basta. É como fazer amor com a pessoa amada. Após o orgasmo desejamos que todo o prazer e encantamento se repita até a exaustão completa do ser.
Paulo André beira o absurdo. É impossível admirá-lo sem se esquecer do que está acontecendo ao redor. Até mesmo o rebolado ao caminhar retirando objetos de cena, na penumbra, arrebatam o olhar e a atenção. Cada gesto, cada respiração, mesmo ocultos, tem o poder de um telescópio! É preciso assistir "Paulo André em os Gigantes da Montanha". Um espetáculo a parte.
Teuda Bara! Suspiro. Como potente rainha em seu trono, como Elizabeth, que tinha todo um reino sob seu comando. Age em nosso sonho sem nos despertar... em seus atos nossos sonhos nunca nos abandonam.
A maravilhosa Inês, e o imponente Eduardo!! A maestria da coluna vertebral do espetáculo, mantendo o eixo e conduzindo toda a emaranhada trama deste corpo gigantesco!
Antonio. Imenso gigante, eterno menestrel.
Conde Arlindo, lindamente senhor, encantador. Mesmo fora do espetáculo, um ser nobre, imerso em mundos que estão além de nossa percepção.
Beto, de uma potência discreta. Com um domínio tão pleno que chega a ser irritante, não irritante no sentido do incômodo, mas no sentido do estimulo.
Julio Maciel, meu eterno diretor. Sempre lindo e encantador. Precisa de pouco, como o poeta, para nos libertar dos fatos.
Lydia e Regina, soberbas cantrizes. O Silêncio, sublime, se estabelece, ao ouvi-las.
Simone! Acho que o trombone é realmente o seu instrumento! Ao vê-lo, inerte, percebemos seu mistério e somos hipnotizados, e ao ouvi-lo nos perdemos em nós mesmos com a força que dele emana.
Arlindo e Simone, são duas pessoas lindas de se ver, mesmo fora de cena. Há momentos em que eles estão em um mundo outro, e só por lhe darmos nosso olhar, somos levados a outro universo, misterioso e sublime.
Luiz Rocha. Não posso deixar de citar Rodolfo Vaz. Sei que não é uma substituição, pois não é possível substituir alguém como Rodolfo e suas mortes. Mas não quero negar que Luiz Rocha ocupou este lugar. Se Rodolfo se Vaz, Luiz é Rocha. Piada infame. Que maravilha vê-lo, menino, neste espaço tão, tão, tão!!!
Em resumo... não... não é possível resumir... são 30 anos... É uma celebração. Uma célebre ação!!!
Uma "contínua embriaguez celeste".
Imensamente grato! Eternamente agradecido!

domingo, 18 de agosto de 2013

FAMÍLIA!!!

     Temos sempre tanta coisa para fazer... tantos planos, tantos sonhos, tantas angústias. E hoje foi um dia em que eu, a Alani e o Marcelo perdemos nosso tempo indo até Embu Guaçu conhecer o Espaço Cultura Hervé de Froberville. Eu ia acampar lá, fazer um retiro cultural, apresentar meu trabalho sobre Clarice Lispector chamado "É" no 2º Festival Multicultural que é realizado neste paraíso terrestre. Mas com a chuva, o evento foi transferido para setembro...
     E como foi bom perder este tempo. Ter este plano frustrado. Conhecemos a Fany de Froberville, e descobrimos que o nome do espaço é uma homenagem a seu pai, que tive o prazer de conhecer e tomar uma cachaça para espantar o frio. De lá, trouxe uma muda de cedro para manter aqui na varanda da minha gruta urbana.
     Eu sou Professor de Histórias e amo tudo o que faço, até as coisas "erradas" rsrsrs. E no meu trabalho com meus alunos estou pedindo que eles apresentem suas atividades em blogs e páginas no facebook. É um risco muito grande abrir as "portas" da Escola desta maneira, mas eu sou abusado. E como não podia deixar de ser, estou também fazendo minha lição de casa, postando alguma coisa no meu blog.
    O tema que estamos trabalhando são as Revoluções, em um momento muito oportuno. Especificamente, trabalhamos com as Revoluções do Século XVIII. Mas hoje vivemos um momento de revolução intensa, e esta revolução está ocorrendo não apenas nas macro estruturas, esta revolução ocorre também nos alicerces destas estruturas, como não podia deixar de ser. Me refiro aqui à "estrutura familiar".
     Em um encontro de Professores ouvimos a frase "não existe mais família", "a mãe tem 3 filhos, cada um de um pai diferente".
     Para nossa alegria e aprendizado, a discussão seguiu e conseguimos entender que a família continua, ela apenas não é do mesmo jeito. A mãe com 3 filhos, com pais diferentes, continua sendo uma família, uma família "ampliada", uma família com uma mãe, 3 pais e 3 irmãos.
     Me desculpem por usar os termos na forma masculina, mas em nossa língua não temos uma derivação para abranger todos os gêneros, não que eu saiba... então, por favor, quando digo filhos e irmãos, podem ser filhas e irmãs, hetero ou homossexuais, ou transgêneros, com todas as derivações que já existem ou que venham a existir. E mesmo o pai e a mãe, me refiro a pais e mães também sem determinação de gênero ou função. Nossa língua é muito limitada, e mesmo tomando todo o cuidado possível, as interpretações não são previsíveis, não é possível termos um controle total sobre o sentido das palavras.
     Então, a Família. Como já é da sincronia do universo, este é um tema que tem habitado meus pensamentos e meu coração. Talvez pelo desejo não realizado de constituir uma família minha. Eu faço parte de muitas famílias, sou um ser nômade. Tenho a minha família de sangue. Mas não consegui constituir uma família que eu possa chamar de minha, ter um filho "meu", adotado. Ainda não.
     Então, me volto para esta história, à Família.
     Eu quero, aqui, registrar minha gratidão e homenagem a todas as famílias das quais eu faço parte. E para demonstrar, ou mostrar este registro, resolvi começar com esta foto com a minha Avó Assunta ao lado de minha mãe, a Libera:


     Os nomes já me dizem muita coisa. Adorava prosear com a Assunta, e se luto intensamente por liberdade, acho que não poderia ser diferente sendo o filho da Libera. No colo está a flor da família, a Maria Rosa. Segurando o cachorro um de meus tios, acho que é o tio Toninho... não sei.
     A segunda foto mostra um grupo reunido, todas as irmãs; em pé, Maria Rosa, Líbera e Lúcia; de joelhos a Ana e o tio Luizinho. Os nomes dos tios, todos no diminutivo, menos o mais velho, que é o Santo:
     Mas o motivo da presença desta foto é o fato de, esta casa abandonada, ser a casa onde este grupo nasceu. As irmãs se reuniram neste dia para fazer esta visita. Não foi para visitar uma pessoa. Foi para visitar um lugar, a casa onde elas nasceram.
     Falando sobre mudanças na estrutura da família, ninguém se importou quando os filhos deixaram de nascer "em casa", para nascerem em "hospitais públicos". A família, neste momento, também era outra.
     E não posso deixar de citar o vô Nicola. É incrível a força que vem de sua memória, tendo estado com ele a meu lado por tão pouco tempo. E minha avó Raquel, a Maruxa, uma pronúncia inescritível rsrs. Sei tão pouco sobre eles, mas sinto tanto a presença deles em minha vida... deve ser o lado místico do vínculo paterno. O vínculo materno é mais orgânico, pela própria natureza do ser.
     Mas chega de revoluções e palavras. Vamos por um ponto final nesta história que não acaba aqui, uma foto de minha Mãe Maravilha e de meu Pai Galã!!

A estas duas pessoas, às vezes tão estranhas, às vezes tão entranhas, em mim, por mim, para mim. Agradeço a Deus!

Valeu Viver.